quarta-feira, 13 de maio de 2009

"Não pense que a pessoa tem tanta força assim a ponto de levar qualquer espécie de vida e continuar a mesma.
Até cortar os defeitos pode ser perigoso - nunca se sabe qual o defeito que sustenta nosso edifício inteiro... há certos momentos em que o primeiro dever a realizar é em relação a si mesmo.


Quase quatro anos me transformaram muito.
Do momento em que me resignei, perdi toda a vivacidade e todo interesse pelas coisas.
Você já viu como um touro castrado se transforma em boi?
Assim fiquei eu...


Para me adaptar ao que era inadaptável, para vencer minhas repulsas e meus sonhos, tive que cortar meus grilhões - cortei em mim a forma que poderia fazer mal aos outros e a mim.
E com isso cortei também a minha força.


Ouça: respeite mesmo o que é ruim em você - respeite sobretudo o que imagina que é ruim em você - não copie uma pessoa ideal, copie você mesma - é esse seu único meio de viver.
Juro por Deus que, se houvesse um céu, uma pessoa que se sacrificou por covardia ia ser punida e iria para um inferno qualquer.


Se é que uma vida morna não é ser punida por essa mesma mornidão. Pegue para você o que lhe pertence, e o que lhe pertence é tudo o que sua vida exige.

Parece uma vida amoral. Mas o que é verdadeiramente imoral é ter desistido de si mesma.
Gostaria mesmo que você me visse e assistisse minha vida sem eu saber.

Ver o que pode suceder quando se pactua com a comodidade da alma.”



Clarice Lispector (1947 Berna - Suiça /Carta à irmã)

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